segunda-feira, 31 de março de 2014

Leitura e escrita: O trabalho com a palavra.


por Eduardo Eide Nagai

Nestes dias, quando participei de uma reunião de pais e professores na escola onde leciono Língua portuguesa, comecei a conversar com um dos pais sobre a situação do seu filho. Estávamos conversando sobre o porquê seu filho tirou nota baixa na minha matéria. Falávamos sobre o problema que ele tinha em Ler e Escrever e sobre como poderíamos resolver a situação. Porém, quando o pai mostrou para mim a nota que seu filho tirara em minha disciplina percebi que não era a mesma pessoa. O aluno a que se referia o pai e o aluno a que me referia eram alunos diferentes com o mesmo nome. Foi engraçado, pois as características de ambos eram parecidos.

Isso mostra a dificuldade geral que enfrenta os jovens de hoje (talvez de sempre), a sociedade em que vivemos não motiva os seus membros a ler e interpretar o mundo, muito pelo contrário, já dá o mundo a nós prontinhos. Como se isso fosse possível. Podemos dizer que vivemos a era Delivery, ou seja, não precisamos trabalhar o mundo. Ele já está pronto, precisamos desfrutar desta maravilha que criamos. Percebemos em cada relação nossa com a sociedade. Se queremos comida, pedimos nossas pizzas. Se queremos distração, assistimos novelas. Se queremos aprender, os professores transmitem o conhecimento e a ciência já produzidos.

Ler e Escrever são dois lados de uma mesma moeda, ou seja, ambos são trabalhosos e árduos. Ambos exigem reflexão. Atenção. Produção de sentidos. Ambos são processos ativos. Outras pessoas dão à produção de texto o caráter de ativo e a leitura de passivo. Mas isso é um equívoco. Nos dois casos nos esforçamos para trabalhar a palavra. A leitura requer invenção do mundo da mesma forma que a produção de um texto. Ambos são sujeitos, o que escreve e o que lê. Ler não é correr os olhos em uma palavra, mas ler é sobretudo contruir sentido por sentido, como se fosse uma casa em construção. Ler é trabalhar a linguagem. Ler é posicionar-se no mundo. Ler é investir tempo e energia pesada no mundo.

Precisamos ver a leitura deste ponto-de-vista. Como uma a construir. Como um porvir. Como um trabalho.

Se trabalhar é dar sentido a nossa vida, então ler também é estar no mundo com o mundo para o mundo. Ler é existir.

A IMPORTÂNCIA DO ATO DE LER COM QUALIDADE

É sempre difícil começar a escrever um texto. Ficamos perdidos nos milhares de informações e temas que podemos explorar. Ficamos perdidos nos infinitos pontos de vista que podemos defender. Assim é o processo difícil e árduo de escrever. Porém hoje, com o avanço da informática e da internet, parece que podemos simplesmente vomitar o texto. Soltar algo sem nos preocuparmos com a forma, com a estrutura. Os blogs, as comunidades, os perfis, os scraps, os e-mails, e tudo mais que a internet nos oferece fez com que as pessoas conseguissem escrever de maneira mais solta. Mais à vontade.

Isso é um fenômeno interessante de se perceber. As pessoas escrevem. O problema não está nisso. O problema é quando os alunos transferem esta escrita para a sala de aula. Sou professor de português e percebo isso nitidamente. Corrigindo as redações percebo a ausência de acentos gráficos, de pontuação, de ortografia, etc. Os textos inclusive estão menores e tudo mais. Há ausência também de argumentos. Ora. As pessoas estão escrevendo mais, mas ao mesmo tempo desaprenderam a se expressar.

Não estou com este texto querendo criticar a internet, muito pelo contrário, acredito nos benefícios que ela PODE nos oferecer. Também não quero criticar os alunos que estão desaprendendo a escrever. Mas quero ressaltar a responsabilidade que nós, professores, temos de saber lidar com isso e remar contra a maré, ensinar os homens e mulheres a se expressarem de acordo com a situação. Com o contexto. Com o gênero textual que o sujeito se propõe a escrever.

O ato de escrever é tão importante quanto o ato de ler. Estes dois se completam a partir do momento que este último nos faz conhecer o mundo e o primeiro nos faz nos relacionarmos com este mundo. Não adianta eu apenas conhecê-lo, é preciso estar em contato direto. Interagir com ele. Mudá-lo. A nossa escrita faz com que eu perceba o mundo de forma mais organizada. Não aprendemos apenas quando lemos, mas também quando escrevemos, pois é neste ato de escrever que eu vou ter que relacionar tudo o que já vi, o que já li, o que já vivi.

Aprender a escrever é um direito de todos os homens e mulheres deste mundão. Se estivermos escrevendo na internet, no caderno, no vestibular, no diário, nos panfletos, nos ofícios, ou em cartas para outras pessoas, que a gente compreenda o que nós estamos fazendo. Transformando o mundo.



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